quarta-feira, 28 de dezembro de 2016




2016/2017


Não me lembro das passagens de ano, em Manaus, quando era jovem. Comecei a notá-las, quando mudei pra o Rio de Janeiro, no fim dos anos quarenta. Era mais pé no chão, ou melhor, na areia. Não tinha a parafernália que tem hoje. Fogos no meio da baía, palcos para shows e outras "mumunhas", como diria a saudosa Araci.
No começo, décadas de cinquenta, sessenta, setenta, ainda podia-se flanar pelas ruas do Rio, sozinho, durante a noite. A marginalidade era pontual. Copacabana e o Centro da cidade eram os palcos de todos os entretenimentos, de então.
O meu prazer, mesmo, na noite da virada (como se diz hoje) era caminhar pela praia, as vezes descalço, apreciando e recebendo passes de pais ou mães de santo, em plena praia, ao murmúrio do mar. Os altares eram grandes cavidades na areia, onde, protegidas do vento, se colocavam as imagens de Iemanjá, a rainha da festa, rodeada de lírios e velas. Toda a praia era um imenso baixo relevo dedicado a Deusa.
Ao se aproximar da meia noite, as charangas começavam a tocar, os tambores a ruflar, os fogos desciam em cascata do topo do Hotel Mediterané e todo mundo de branco começava a cantar, se abraçar e se beijar, numa tristeza de adeuses pelo ano que morria e de alegria pelo que nascia, ao som daquele enorme coral. Era como no samba-choro de Assis Valente, de 1938, cantado por Carmem Miranda:
“beijei na boca de quem não devia
peguei na mão de quem não conhecia
dancei um samba em traje de maiô
e o tal do mundo não se acabou ."

Mas, ontem como hoje, o meu desejo mesmo é que todos tenham um feliiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiz e próspero -  2017.                                 

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Uma esquina de São Luís - MA


REDE


A rede foi o primeiro móvel brasileiro registrado pela história: a Carta de Pedro Álvares Caminha, do dia primeiro de maio de 1500. Certidão de nascimento do Brasil. Pero Vaz assim a notificou a D. Manuel:” e de esteio a esteio uma rede com cabos em cada esteio, altas, em que dormiam. E debaixo, para se aquentarem, faziam seus fogos.” Aconchego e calor, digo eu.

Foi naturalmente a primeira cama dos invasores, conquistadores, colonizadores, cafusos, negros, mulatos, sararás. Nelas foram gerados nossos primeiros ancestrais. Nelas amaram, gemeram, pariram, morreram e foram enterrados os primeiros brasileiros. Como até hoje nos cafundós do sertão ou nas profundezas das matas amazônicas. Herança indígena.

Atravessou a história, entrou no folclore, na sociologia, na antropologia, no romance, no cinema, na música e como não poderia deixar de ser na poesia. Pois é assim que ouço Jorge de Lima:

“........................Fulô!
vem coçar minha coceira,
vem me catar cafuné,
vem balançar minha rede,”

Seu nome prestou-se a outras atividades: rede de pescar, rede telefônica, rede de espionagem, rede elétrica, tecido fino de malha com que as mulheres protegem os seus cabelos e agora a maior rede de comunicação do mundo: internet.


Mas é como diz poeticamente um dos meus dicionários “leito balouçante, preso por duas extremidades, geralmente dois portais ou duas árvores”, que ela me seduz. Os desenhos, as cores, as varandas, a envolvência sensual com que recebe os corpos, que nelas se deitam e que me faz logo pensar no dito popular: abaixo do Equador tudo é permitido. Na rede, é claro.

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