terça-feira, 19 de dezembro de 2017


Turista?

A casa onde nasci, ficava a beira do Igarapé de Manaus. Quando o rio Negro enchia muito o quintal virava uma piscina natural. Diziam. Nunca vi. Pois, com dias de nascido minha avó materna me levou para a fazenda Iracema, no Amatari, onde morava, e lá me criou até os oito anos de idade. A viagem foi de lancha e devia durar umas seis ou oito horas, rio Amazonas a baixo.
Quando voltei para Manaus, para estudar, a família não morava mais na casa da Rua Joaquim Nabuco, a beira do Igarapé, mas na Rua Epaminondas, longe do rio. Casa, na qual, sofri a minha adolescência. Parece que essas duas primeiras viagens marcaram muito a minha futura visão de mundo. Pois um dos passeios solitários que mais gostava de fazer era: visitar o “Roadway”, principalmente nos dias de chegadas ou partidas de navios.
No Ginásio, era apaixonado pelas aulas de geografia do professor Agnelo Bittencourt. Passei a gostar de mapas. A poesia de Branca Menescal de Vasconcelos me apresentou o mar. Ansiei por conhecê-lo. Até que um dia tomei um navio no norte (parodiando Caimy) e vim a Fortaleza, onde tinha parentes.  E conheci os verdes mares bravios... de Alencar. E entendi também que viajar era preciso.
Quando comecei a trabalhar pra valer, passava o ano inteiro juntando uns trocados para nas férias fazer uma viagem. Os meus colegas de trabalho, no Rio, diziam que eu era como os componentes das escolas de samba. Eles passavam o ano inteiro economizando para o carnaval, eu, para as viagens.
Assim, viajei o Brasil, de norte ao sul, de leste a oeste. Viajei, não, ainda viajo. Creio que não há no mundo país mais mutante que o Brasil. Cinco anos de ausência – e o lugar já não é o mesmo. Ainda que as cidades não mudem, creio que nunca se faz a mesma viagem. Cada viagem é uma nova viagem. Ninguém vê tudo. Principalmente nos lugares onde as estações são bem definidas.
Ganhei o título de turista. O que sempre me propus ser. Não o “Turista Aprendiz”, de Mário de Andrade, talvez, um turista apressado, tout court.

quinta-feira, 7 de dezembro de 2017


Da velhice
 Até os trinta, os homens pensam para a frente; dos quarenta em diante, começam a olhar para trás; até que um dia seus assuntos são exclusivamente – o passado.
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Não me importa ser chamado de velho, não quero que digam que sou antigo. Antigo é peça de museu. Eu não.
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Velho com alma de jovem – é aleijão. Comigo não, violão.
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A velhice não proporciona sabedoria a ninguém. Só é sábio o velho que já o era antes.
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O homem tem a idade que tem. Seja sábio, seja tolo. O velho, por ser homem, não foge a regra.
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Viver é como escalar um Aconcágua.  A cada degrau perdemos mais e mais oxigênio, sem possibilidade de reposição.
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A velhice é também uma questão de ponto de vista. Para o menino de cinco anos o rapaz de quinze já é “tio”, o de vinte e cinco já é “coroa” e o de trinta e cinco já é o “velho”.
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A vida é longa para aqueles que nada fizeram. Para quem tudo fez a vida é do seu próprio tamanho.
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Eu sei que é por higiene, mas me dá uma pena danada ver esses velhos muros gretados, cobertos de heras e musgos, pintados de novo. Parece esses velhos querendo disfarçar a idade, com os cabelos pintados de acaju.                    
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Ah! Esses velhos de cabelos pintados de preto preto, ressaltando o macerado da pele pontilhada de manchas senis, velhos “peruas”.            
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Envelhecendo vamos perdendo a memória. Vamos apagando a nossa própria história.
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Como os velhos não teem futuro, pensam no pretérito. Predicam com exemplos. Daí, os moços pensarem que eles estão sempre se tomando como paradigma. Simples erro de perspectiva. Quem viver, verá.
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Há velhos que usam da idade para obter privilégios. Mutatis mutandis, é o mesmo tráfico de influência dos políticos. Argh!
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Uma das compensações da velhice é que o velho pode dizer o que quiser. Se agradar é porque ele é sábio; se não agradar é – esclerose.

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